terça-feira, 7 de dezembro de 2010

PENA DE MORTE - OBJEÇÕES I ¨Pena de morte jᨠPe. Emílio Silva

a)    A pena de morte produz um efeito criminógeno, induz ao delito.

Afirmação gratuita e sem a menor prova, e contrária às mesmas leis da psicologia humana e da pedagogia : a vista dos castigos retrai as faltas. "A execução parece ser prejudicial para o povo, que pode ter ocasião de seu exemplo para pecar. Logo não se deve impor a pena de morte por nenhuma culpa." Esse efeito criminógeno não se dá "quando juntamente se dá a falta e o castigo publicamente, já seja de pena capital ou outra qualquer que cause horror, a vontade humana afasta-se do delito, pois o castigo aterra mais que o que possa atrair a falta". ¹70

O penalista Amor Naveiro não só nega tal efeito criminógeno da pena máxima , como ainda, diz que "é positivamente moralizadora da sociedade, como todas as penas justas, porém em maior grau que as demais. Toda pena imposta merecidamente e com publicidade tende a afirmar nos ânimos dos associados o sentimento de justiça, faz fixar a atenção na importância e odiosidade do delito, e mostra que o direito é uma coisa respeitável que não se pode burlar impunemente". ¹7¹

Válida a objeção de que a vista da punição é criminógena, havia logicamente que suprimir-se todas as penas, ou seja, deveria sancionar-se a impunidade mais absoluta porque cada dia se repetem os delitos que não se castigam com pena tão terrível.


b)    A causa mais comum do crime acha-se na miséria e na ignorância em que vive o povo. Portanto não se há de buscar o remédio da delinqüência na pena de morte senão na melhora de vida e na educação e instrução da massa.

Com extrema freqüência se ouve esta objeção, inclusive de lábios de gente de boa fé, porém sem nenhum valor por apoiar-se em falsos supostos. Não são a ignorância nem a pobreza elementos criminógenos. Ao contrário, está provado, e isto o sabem todos os que desta mat´ria se ocupam, que raríssima vez se dá o caso de um criminoso analfabeto. E se, dos executores do crime, passamos aos indutores, não acharemos entre estes nem um só ignorante, senão, com freqüência, indivíduos, grupos ou sociedades, de indubitável solvabilidade intelectual, de par com o mais baixo nível moral.

Quando em Yalta, na Conferência da Criméia, e mais tarde em Casablanca, Roosevelt e Churchill concordaram com o brinde de Stálin pela execução sumária de 50.000 soldados alemães, inocentes prisioneiros de guerra, quem diria que esse abominável genocídio perpetrado pelos "três grandes" - grandes sem dúvida em iniqüidade - era filho da ignorância? ¹73

Menos ainda, poderia atribuir-se o crime à pobreza. Com freqüência na classe pobre há bastante mais honradez que na endinheirada. O ilustre sociólogo ianque Roucek declara que o aumento da criminalidade nos EUA "não é, como muitos pensam, um efeito da pobreza, senão, ao contrário, pois, no meio de uma prosperidade sem precedentes, a nota peculiar do crime levou-a a opulência e não a pobreza; e precisamente o delito de maior incremento é o referente às lesões da propriedade privada". ¹74

E o famoso escritor brasileiro, Nelson Rodrigues, rebatendo também esse falso conceito que atribui a delinqüência à miséria e à ignorância, escreveu: "Vejam os Srs., os quarenta terroristas que foram libertados no seqüestro do embaixador alemão. Há porventura um negro? Há um operário? Não. Há um "favelado" - arrabaleiro? Jamais. São todos das "classes dominantes". São filhos da "alta burguesia". São pais da "alta burguesia". Ninguém encontra um fanático do Flamengo". ¹75

c)   A pena de morte é oposta à concepção moderna da justiça

Será mesmo que com o tempo mudou o conceito de justiça? Haverá hoje duas noções diferentes e contrapostas de justiça, antiga uma, moderna a outra? É clássica a definição que o jurista romano Ulpiano, na linha do pensamento de Aristóteles, Cícero e dos estóicos, deu da justiça: " Constante e perpétua vontade de dar a cada um seu dereito".¹77 Esta noção, adotada e comentada também por Sto. Tomás, segue-a a generalidade dos juristas, até nossos dias. Sto. Tomás, explicando-a, diz que "seu" ou "seu direito" é "aquilo que lhe é devido segundo uma igualdade de proporção", que seja castigo do mal praticado ou retribuição do bem que se fez. Claro está que, neste conceito de dar a cada qual o merecido, inclui-se a pena máxima, quando o delito foi extremamente grave. Será isto o que é preciso modificar na "concepção moderna" da justiça?

A esta alteração ou mutação do conceito de justiça opõe-se, por inteiro, a tradição jurídica, que se resume nestas palavras: "Toda a teologia católica enuncia com Sto. Tomás que, por direito natural, é justo e lícito à autoridade pública infligir diretamente a morte aos malfeitores como pena pelos mais graves crimes." ¹78

Ofende-se a justiça deveras não retribuindo o bem, nem castigando o delinqüente, segundo aquele aforisma jurídico de Siro, que jamais foi posto em dúvida por ninguém: "Judex dammatur ubi nocens absolvitur" - A absolvição do culposo é a condenação do juiz - ¹79 ou como sentenciou Shakespeare: "A clemência para o homicida é homicida."













170 Sto. Tomás, Suma Teol., 2-2, q. 108, a. 3.
171 Amor Naveiro, El Problema de la Pena de Muerte, 2ª ed., Madrid, 1917, p. 206.
173 Vid. Los documentos de Yalta, trad. esp. de G. Aguirre de Cárcer, in R.E.P., 1956, p. 11-12
174 Joseph S. Roucek, Crime. The American Way of life, in RIS, XXVI (1968) 41-48.
175 Nelson Rodrigues, O Globo, 19-VI-70.
177 Dig. L. I Tit. I leg. 10 Iustitia est.
178 Teófilo Urdánoz, Introducción à q. 64 da 1ª parte da S. Teol. (BAC) VIII, 422
179 Publio Siro, Sententine, ap. Meyer, Die Sammlungen der Spruchverse des Publius Syrus, Leipzig, 1873, nº 257.

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