quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

PENA DE MORTE - OBJEÇÕES III "Pena de morte já" Pe. Emílio Silva

f)    O homem não pode medir a culpa do homem. Só Deus conhece a intimidade do homem, e só Ele lhe pode medir a maldade. Portando a pena só está em mãos de Deus.

Este argumento estranho e chocante, fundado na não distinção dos foros interno e externo, é de Vecilla de las Heras. Segundo este autor, como a malícia e o pecado são internos no homem e, portanto, não sendo mensuráveis nem ponderáveis, não podem ser suscetíveis de módulo que nos sirva de norma para calcular a dimensão ou gravidade da pena merecida, esta não pode ser infligida.

A ser válida a objeção, nem a pena capital nem nenhuma outra pena poderia infligir-se sem perigo de injustiça. Tão pouco o governante poderia premiar com eqüidade o bem, pois sendo a bondade como a malícia fenômenos internos, íntimos da pessoa, não sujeitos à medida, só Deus poderá dar o justo a cada um.¹84

Que o governo ou autoridade social será essa que está incapacitada para premiar o bem e castigar o mau proceder de seus membros?

(...)"A pena não é uma expiação do mal moral, senão nas mãos de Deus", o que é de toda evidência pois do mal moral ou pecado só Deus lhe conhece a malícia. Mas, imediatamente, o insigne autor, distinguindo a maldade interna das ações ou seja o mal moral, que pertence ao foro interno, do ato externo delituoso que consiste na violação de uma lei que leva anexa uma pena, acrescenta: "A pena é somente um instrumento de conservação da humanidade, e da defesa de seus direitos, de que se há de tomar a norma de sua extensão e de seus limites." ¹85

As penas, seja de que tipo for, impõem-se em conta, não a malícia interna do réu, que só Deus conhece e pertence ao foro interno, senão segundo a apreciação humana do ato externo delituoso. Essa condição de que a violação constitutiva do delito punível deva ser externa já era exigida no Direito Romano.¹86

A Igreja  tem, desde as origens, sua legislação penal, com diversidade de sanções e castigos, e, não obstante, é aforismo canônico que "Não castiga a Igreja os atos internos".

Quando qualquer um comete um grave delito, enquanto pecado, o mal moral remete-o a Igreja ao tribunal da penitência, que conhece somente o que concerne ao foro interno; porém enquanto delito, manda-o ao tribunal ou foro externo para ser julgado e receber o que mereça, como delinqüente. Um exemplo (conhecido): A justiça italiana condenou o agressor do Papa, Mohamed Ali Agca, a cadeia perpétua, e o principal afetado, João Paulo II, perdoou o agressor.

Análoga à precedente objeção é a que apresenta a escola de
sociologia Criminal, de Garófalo, Ferri, Kimberg, etc. que, havendo negado o livre arbítrio humano, se encontra na impossibilidade de chegar a uma noção aceitável de imputabilidade criminal.¹87 Agora bem, "o fundamento ou título do poder coercitivo é a imputabilidade da ação externa",¹88 e por outra parte, o poder social é o que, à base da imputação provada, inflige o castigo. Se pois se nega a imputabilidade, a autoridade fica inerte e não pode impor pena alguma. A sociedade torna-se ingovernável.


g)    Matar alguém é uma barbárie. A pena de morte é desumana por destruir a vida que é a essência do humano.¹89


De acordo, nada mais certo que matar alguém é desumano, é uma barbárie, razão pela qual é indispensável, ainda à custa de terríveis escarmentos, impedir que os punhais, os venenos e os assassinos se façam presentes e freqüentes no meio de cidadãos pacíficos e inocentes. Por isso, o poder social deve desdobrar toda a força necessária com o fim de que os malfeitores se acobardem e desistam de suas malfeitorias. Se é inevitável que alguma vítima pereça, melhor é que morram os facínoras mas não os inocentes.

Claro está que não faltam as carpideiras, os que se comovem e se derretem ao pensar no patíbulo dos criminosos, porém eu, e comigo, a maioria dos bem nascidos, sinto que são outros os espetáculos que mais nos movem à compaixão. A Gazeta dos Tribunais, de Itália, referia, que um filho sem entranhas, depois de haver golpeado, escarnecido e ensangüentado durante 20 anos, quase todos os dias, seu pai, acabou assassinando-o, fazendo-lhe oito a dez feridas. Pela só leitura do fato sentimo-nos estremecidos por altíssima compaixão pelo pobre ancião, execrando, ademais, aquele filho monstruoso, e sentimos a necessidade de que, estando provado o delito, o expie com a morte. Igualmente uma esposa, durante muitos anos maltratada por seu marido, que lhe provocou o aborto em diversos casos e que depois de haver-lhe mil vezes posto um punhal na garganta, porque a infeliz se lamentava das prostitutas que a sua casa conduzia, estudando bem o golpe, degola primeiro, em sua presença, sua irmã e a mãe, e sua esposa depois de por-lhe as fontes com um martelo e parte-lhe com um punhal o coração. Lendo, o nosso coração comove-se de piedade para com a infeliz esposa, porém, por desgraça, a compaixão é muito distinta entre os homens. Há quem a sente pelo ladrão e quem pelo esbulhado; quem pelo réu e quem pelo inocente, quem pela vítima e quem pelo assassino.

Para o novelista francês Gary, prêmio Goncourt, a abolição da pena de morte não é prova de um maior progresso moral e social, "senão, ao revés, de um retrocesso, posto que supõe tirar valor à vida, à vida mesma que, até ontem, era algo sagrado".¹90 É que para os abolicionistas a vida também é sagrada, porém, não a de qualquer semelhante, senão tão só a do assassino. Este pode matar dez ou vinte inocentes, porém a dele é sagrada, é intocável, privá-lo dela é barbárie, é desumano (!!).









184 Vecilla de las Heras, op. cit., p. 68.
185 Amor Ruibal, Der. Pen. etc. I, 32.
186 DIG. 48, 19, 18 Ulpianus.
187 Cfr. O. Kimber, Über die Unzulängligkeit aller Versuche einen Begriff der Zurechnunfäigkeit aufzustellen, in Monatschrift für Krim. Psych. und Strafrechtreform.
188 Wernz - Vida, Ius Canonicum, Roma, 1937, tomo VII, p.30.
189 Barbero Santos, in La pena de muerte. 6 Respuestas, Madrid, 1978, p. 11.
190 Ap. Monsegú, in Roca Viva, VI, junio 1973, 470.

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